
Avaliação psicopedagógica no Autismo
O objetivo do texto será apresentar alguns instrumentos e como essas características podem ser observadas para chegarmos a essa suspeita.

Os psicopedagogos não fecha diagnóstico, porém pode observar aspectos do desenvolvimento, se há algum atraso ou como está o processo de aprendizagem, além de poder observar comportamentos que auxiliam no levantamento de hipótese de um diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA).
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Para investigação na psicopedagogia, é utilizado a avaliação psicopedagógica. Essa avaliação possui alguns instrumentos, compartilhados com outras áreas, principalmente a área de psicologia. É dividida por etapas, que considera o paciente, sua idade e suas dificuldades, a fim de montar a avaliação. Os recursos para avaliação incluem testes, observações e entrevistas.
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ROTEIRO DA AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA PSICOPEDAGÓGICA
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Tomando por referência principal a Epistemologia Convergente, do autor Jorge Visca, nossa opção de avaliação propõe os seguintes instrumentos.
1. QUEIXA
2. E.O.C.A. e/ou OBSERVAÇÃO LÚDICA e IPI (levantamento dos primeiros sistemas de hipóteses, definição das linhas de investigação, escolha dos instrumentos).
3. PLANEJAMENTO E APLICAÇÃO DAS PROVAS E INVESTIGAÇÃO - IPI
4. INSTRUMENTOS FORMAIS
4.1. Área cognitiva;
4.1.1. Provas Piagetianas;
4.1.2. Provas projetivas psicopedagógicas;
4.1.3. Provas psicométricas (uso exclusivo do psicólogo);
4.2. Área Afetiva
4.2.1. Provas projetivas psicopedagógicas
4.2.2. Provas projetivas psicológicas (uso exclusivo do psicólogo);
4.3. Área Funcional
4.3.1. Aspectos psicomotores;
4.3.2. Linguagem;
4.3.3. Sensorial;
4.3.4. Conceitos básicos;
4.3.5. Habilidades acadêmicas: leitura, escrita, matemática (levantamento do 2o sistema de hipóteses e investigação);
5. HISTÓRIA DE VIDA -ANAMNESE;
6. LEVANTAMENTO DE DADOS ESCOLARES;
6.1. Entrevista com os profissionais da escola;
6.2. Análise do material escolar;
7. PROVAS E TESTES COMPLEMENTARES (desempenho da análise das provas anteriores; exames clínicos complementares; análise da expressão plástica;
análise de tarefas; outros);
8. ANÁLISE DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO DA HIPÓTESE DIAGNÓSTICA​
9. INFORME PSICOPEDAGÓGICO
10. DEVOLUTIVA
11. PROPOSTA DE INTERVENÇÃO.
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Primeiro, começamos com a Entrevista Inicial Exploratória. A entrevista inicial exploratória também pode abordar esse assunto, mas é mais focada na aprendizagem. Entrevista Inicial Exploratória serve para entender principalmente o desenvolvimento psicomotor (quando falou, quando andou, etc) e questões que estejam atrapalhando a aprendizagem. Aqui, podemos levantar hipóteses de autismo, conforme atraso nos marcos do desenvolvimento e os sintomas clássicos que estamos habituados a verificar, como ecolalias, movimentos repetitivos, birras por rigidez cognitiva ao mudar rotinas, alimentação, etc.​
Segundo, realizamos a Entrevista Operativa Centrada na Aprendizagem (E.O.C.A) - Nesta etapa temos instrumentos de materiais diversos para analisar o vinculo emocional e afetivo, voltado à aprendizagem. Nesse instrumento de avaliação, numa primeira atividade, utilizamos materiais de papelaria diversos e direcionamos a criança a mostrar, tudo que ela aprendeu. Na outra atividade, chamada de “hora do jogo pedagógica”, separamos materiais dentro de uma caixa, tanto materiais relacionados a papelaria quanto brinquedos e observamos como ela interage com eles. Nesse sentido, focamos em analisar como as crianças se organizam num conhecimento de nível representativo. Nesta etapa, conseguimos perceber os modelos de aprendizagem e os vínculos com o processo do aprender. Como o autismo pode ser identificado nessa etapa? Vou relatar aqui um exemplo de um paciente, de 9 anos, diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade.​​
Os materiais foram colocados à frente do paciente e foi feito o pedido para que mostrasse com aqueles materiais, o que aprendeu. Foi percebido que ao deixar o direcionamento aberto dessa forma, o paciente ficou confuso e perguntou: Mostrar o quê? Num sentido literal, entendi que precisava de um comando direto. Como os livros nos orientam, caso não haja resposta, podemos perguntar o que a criança gosta, pegar os instrumentos e fazer um trabalho. Foi isso que fiz. Apesar de ter uma variedade de materiais, o paciente pegou lápis e papel sulfite branco. Ficou olhando pra mim, nervoso com minha reação e falou timidamente, se poderia escrever uma parlenda. Autorizei e ele escreveu uma “Parlenda”, um trava línguas e parou. Ficou olhando pra mim. Perguntei se não tinha mais alguma coisa que gostaria de mostrar. Pediu autorização para fazer uma conta matemática, que estava correta, montou a conta e resolveu, como se tivesse gravado em sua memória. Na outra sessão, que continuamos, fez uma palavra cruzada, mas não sabia se dizer o que era. Fez um origami de coração, um origami de shuriken. Falou que queria ser professor de artes, falou disso a sessão toda.
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Pude notar, que o paciente entendia as coisas exatamente como eram faladas. Também, notei que lembrava de coisas visuais, mais que auditivas. Que seus produtos eram de coisas que tinha certeza, de materiais familiares, não explorando outras possibilidades e que falou sobre seu hiperfoco, artes. Também demonstrou ansiedade social, preocupado com o que eu estava achando, melhorando apenas quando expliquei melhor sobre o teste, que não era uma avaliação com nota. A mãe disse que ele gosta muito de dobraduras e que reunia muito papelões em casa.
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Em terceiro lugar, podemos aplicar Formulários, Questionários, Fichas e outros materiais de investigação de acordo com a necessidade. Aqui, podemos colocar os questionários de autismo. Se está em investigação psicopedagógica, provavelmente está perto de uma idade escolar inicial ou mais pra frente. Isso no caso do autismo, exclui alguns questionários que poderiam ser aplicados. Alguns questionários que poderiam ser aplicados nessa faixa etária são ATA (avaliação de traços autísticos), Vineland-III (aplicado para escola), ABC ou ICA (Checagem do comportamento Autista). Cada um terá seu resultado, que ajuda na investigação, tirando as observações qualitativas que aparecem durante o preenchimento deles.
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Em quarto lugar, As provas piagetianas são uma forma de investigar o desenvolvimento cognitivo de uma criança conforme a idade. Nela os testes servem para avaliar conhecimentos específicos. Não é necessário você ter um desenvolvimento cognitivo menor que idade para ter suspeita de TEA, mas pode aparecer alguma característica que dê indícios através dessas provas.
1. Provas de Classificação – avaliam o domínio do sujeito a respeito da classificação. São elas: conservação do número, matéria e líquido.
2. Prova de Seriação: Consta de 10m palitos graduados para serem organizados segundo seu tamanho.
3. Mudança de critério ou Dicotomia consta de fichas com os atributos: cor, forma e tamanho, que devem ser destacados pelo sujeito, conforme ordem dada.
4. Qualificação da inclusão de classes esta prova pode ser realizada com flores, como o original, ou com animais ou frutas, pois permite avaliação da qualificação inclusiva a respeito das classes com os elementos das subclasses.
5. Interseção de classes nesta prova se investiga o grau de operatividade a respeito das operações lógicas no trato com as classes.
6. Conservação: a conservação diz respeito à igualdade e possibilita a percepção de que mesmo diante de transformações o objeto conserva sua identidade, integridade ou qualidade em questão. Estas questões são importantes para os processos reguladores das atividades do sujeito em sua adaptação frente à realidade. O que se observa nestas prova é o êxito ou não na variável quantitativa em distintos conteúdos.
6.1. Conservação de pequenos conjuntos discretos de elementos – prova das fichas ou dos números, possibilita a verificação da conservação da equivalência numérica com quantidades discretas, apesar das transformações que foram expostas. Parte-se da correspondência termo a termo.
6.2. Conservação da quantidade de líquido – prova do transvasamento de líquido, investiga-se o grau de conservação com um material físico contínuo em diversas variáveis.
6.3. Composição da quantidade de líquido – nesta prova o sujeito deve encontrar a solução num processo de síntese, diferente do anterior que era por meio da análise do material.
6.4. Conservação da quantidade de matéria – prova da massa, utiliza um novo material (massa de modelar), uma está relacionada à anterior.
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Até 6 anos
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Provas de conservação: de pequenos conjuntos discretos de elementos da quantidade de líquido
Provas de classificação: de mudanças de critério ou dicotomia.
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6 e 7 anos
Provas de seriaçãoProvas de conservação: de pequenos conjuntos discretos de elementos da quantidade de líquido, da quantidade de matéria, da composição da quantidade de líquido;
Provas de classificação: de mudanças de critério ou dicotomia,
interseção de classes ou qualificação da inclusão de classes.
Provas de seriação
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8 e 9 anos
Provas de conservação: da largura, de peso, do volume.
Provas de classificação: interseção de classes ou qualificação da
inclusão de classes
Provas de seriação
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10 a 12 anos
Provas de conservação: da quantidade de matéria, da largura, da
composição da quantidade de líquido, de peso.
Provas de classificação: interseção de classes ou qualificação da
inclusão de classes
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Provas projetiva psicopedagógicas - São equivalentes a provas projetivas, da área de psicologia, mas visam entender outras questões ligadas ao aprendizado. O desenho que é pedido, apenas é utilizado lápis, borracha, papel, não precisa colorir. Envolve contextos conforme idade, como por exemplo, desenhar alguém que ensina e alguém que aprende, a planta da escola, eu com meus colegas, a planta casa, os membros da família fazendo algo, meu aniversário, minhas férias, etc. O autismo pode ser demonstrado, além do que o aprendente vai demonstrando de personalidade e características, nos desenhos. O aprendente pode desenhar apenas seu hiperfoco, pode ter uma visão reduzida do ambiente (como um paciente que desenhou nos quatro momentos do dia ele sentado em cadeiras em todos os quatro momentos, sem nenhum desenho do ambiente ao redor. Ao ser perguntado, apenas disse que era sua rotina, não demonstrou em sua fala nenhuma ligação com o ambiente). Pode não desenhar pessoas, ou personagens quadrados ( que indicam rigidez), ou outras características no desenho que indiquem possível característica de uma criança que pertença ao TEA.
Também pode ser aplicado nesta etapa Avaliação de Desenvolvimento Motor, Prolec (Provas de processo de leitura e escrita), TDE (teste de Desempenho Escolar), ferramentas que podem enunciar uma suspeita de autismo, através de um possível atraso no desenvolvimento, mas como jah foi dito, não é regra o prejuízo cognitivo por ser TEA.
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Deixado como item 5 no roteiro da avaliação, na anamnese podemos ver questões relacionadas à aprendizagem, que é o foco da psicopedagogia. Aqui, também temos informações sobre o comportamento, gestação e desempenho escolar, etc. Geralmente, eu faço a anamnese antes ou junto com a Entrevista Inicial exploratória, mas pra ficar na ordem, eu coloquei aqui.
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Em sexto lugar, ocorre uma entrevista básica com o professor, onde se pergunta da personalidade e das dificuldades do aprendente, que não necessariamente são indicadores de autismo, mas que ajudam a complementar a hipótese dessa suspeita. O material escolar que envolve a mochila, as apostilas, os cadernos, os itens pessoais e o conteúdo no caderno, também ajudam a detectar alguma característica, que não fecha um possível diagnóstico, mas ajuda a verificar o vínculo do aluno com a escola.
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No setimo lugar do roteiro, provas e testes complementares serão aplicados caso se tenha alguma dúvida, porém, se você conseguiu observar, essa avaliação é bem longe, então, é dado muito tempo para verificar todas essas informações.
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As últimas etapas se resumem de fato a análise e levantamento de hipóteses, informe pedagógico, devolutiva e propostas de intervenção, a união de todas as informações que foram analisadas até agora e o uso dessas informações. Dependendo do grau no autismo, o paciente já chega na idade de alfabetização com suspeita ou diagnóstico, mas quando não, pode ser encaminhado agora.
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Referências Bibliográficas
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FERREIRA, L. S. B. Guia de Práticas em avaliação psicopedagógica. Ello Cursos, 2024. Disponível em: <www.ellocursos.com.br>. Acesso em 15 de maio de 2024.
Novaes D, Freitas AP. A constituição da criança com autismo: Diagnóstico e suas implicações. Rev. Psicopedagogia 2024;41(124):21-32
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<https://repositorio.ufpb.br/jspui/bitstream/123456789/2651/1/RSS25102017.pdf>. Acesso em 10 de Maio de 2024.
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Testes psicológicos para auxiliar no diagnóstico do TEA. AvaliarPsicologia, 2022. Disponível em: <https://www.avaliarpsicologia.com.br/post/testes-psicol%C3%B3gicos-para-auxiliar-no-diagn%C3%B3stico-do-tea>. Acesso em: 17 de junho de 2024.
YABE, Izabela de Gracia. Instrumentos para o diagnóstico psicopedagógico clínico. Curitiba: Contentus, 2020. E-book. https://plataforma.bvirtual.com.br/Acervo/Publicacao/182527
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